EDGAR RACY | VISTA GROSSA

22.10.2022 — 04.12.2022

 
Vista grossa, pelas lentes de Edgar Racy, se dirige a uma compreensão sensível do mundo, em que comer é necessidade primeira da existência humana.
— Paula Borghi
 
 
 

Muitas das expressões linguísticas fazem referência às características próprias do local em que se encontram, em decorrência, sobretudo, das nuances culturais, sociais e políticas que as perpassam. São modos de dizer que se comportam como sintomas regionais, que dificilmente conseguem ser traduzidos para outro idioma, quanto mais manterem seus significados simbólicos e semânticos em outra língua. Isso porque, algumas dessas expressões nada mais são do que arranjos de palavras que vêm ao mundo com o intuito de palavrear aquilo que até então era inefável ou que não pode ser dito com suas próprias palavras.

 

Ao traduzir para o inglês o título da exposição tem-se “View thick”, ao pé da letra, e “Turn a blind eye”, por uma tradução mais sensível ao seu significado expressivo. De modo que, ao se mudar a perspectiva do local, a expressão “vista grossa” no Brasil pode ser completamente diferente de “turn a blind eye” nos EUA, por exemplo. Pois por mais que ambas comuniquem um mesmo assunto, a divergência do entendimento sobre elas é capaz de constituir um abismo abissal naquilo que está subentendido em cada cultura. Não há dúvida de que em qualquer pais do mundo pode-se fazer vista grossa, mas isso não significa que esta será feita da mesma forma. 

Para além das subjetividades que constituem as características regionais, cabe mencionar o tempo enquanto determinante para a compreensão de determinadas expressões. Por exemplo, fazer vista grossa em um mesmo local nos dias de hoje é completamente diferente do que há dez anos atrás. Já, fazer vista grossa em locais e temporalidades distintas faz com que seus entendimentos sejam outros. Assim como na física, tempo e espaço agem juntos no mundo e em sua leitura.

 

Ao encontro desta percepção, vale mencionar que toda a exposição foi pensada e criada durante um dos períodos mais críticos que a humanidade sofreu nos últimos tempos. Vista grossa, pelas lentes de Edgar Racy, se dirige a uma compreensão sensível do mundo, em que comer é necessidade primeira da existência humana. Partindo do ato de comer como uma luta diária - uma luta pela sobrevivência - o artista enfatiza o tema com poucas palavras: “Não é nada mais do que além da fome”.  É a partir deste ponto de fricção comum que abarca a humanidade como um todo, que a exposição problematiza a fome enquanto emergência crucial a ser combatida para a preservação da vida.

 

Assim como na história da humanidade, o tema da fome é um assunto que atravessa a produção artística de Edgar Racy há tempos. Faz-se urgente abordar a questão com mais ênfase, sobretudo por meio desse sentir sensível das urgências do mundo diante desse espaço e tempo de crise humanitária. Uma crise de doer a barriga, de sentir o estômago se contrair por estar vazio. Foi a partir da empatia que tocou seu estado de espírito, que o artista desenvolveu os trabalhos aqui presentes.

Paula Borghi

 

FOTOS

 
 
Eduardo Fernandes